Ter diabetes tipo 2 pode representar um primeiro passo para o desenvolvimento do mal de Alzheimer. Os dois males têm uma relação cada vez mais comprovada no meio científico, e agora pesquisadores brasileiros conseguiram mostrar que o mecanismo de ambos também é bastante semelhante. E não só, notaram que uma droga para esse tipo de diabetes pode também reverter alguns sintomas do Alzheimer, como prejuízos à memória.
O estudo publicado na “Cell Metabolism” provou os efeitos com a liraglutida, um medicamento recente, aprovado em 2010 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Trata-se de um remédio sintético injetável semelhante à insulina, mas com um mecanismo diferente e indicado a pacientes resistentes a ela.
— Do ponto de vista epidemiológico e clínico, a correlação entre as duas doenças já existia. O diabético tem uma tendência a desenvolver Alzheimer e vice-versa. O que faltava era entender por que doenças aparentemente tão díspares têm esta relação — comentou um dos autores da pesquisa, Sérgio Ferreira, do Instituto de Bioquímica da UFRJ.
Estudos anteriores indicavam que os neurônios de pacientes com Alzheimer não respondiam bem ao hormônio insulina e que pessoas com diabetes tipo 2 são mais propensas a desenvolver o Alzheimer. Nesse tipo de diabetes, o organismo se torna resistente à insulina. Já no Alzheimer, há o que eles chamam de nova forma de diabetes no cérebro, ou seja, a resistência ao hormônio ocorre no órgão e afeta os neurônios.
Embora não haja consenso definitivo sobre as causas exatas do Alzheimer, sabe-se que o cérebro acumula placas da proteína beta-amiloide que levam à morte das células nervosas. Na verdade, é o acúmulo de pequenos grupos de beta-amiloide chamados oligômeros que leva à destruição das sinapses (a comunicação entre os neurônios). Eles, desta forma, provocam a perda das funções dos neurônios e aumentam a resistência à insulina, importante na formação de memórias.
— Se os neurônios não respondiam mais à insulina, resolvemos tentar uma droga que resolvesse este problema, e os resultados foram melhores do que o esperado. Ela conseguiu prevenir e reverter danos à memória em estágio avançado da doença — explica Ferreira. — Além de investigar o mecanismo de ambas as doenças, testamos a liraglutida, que simula os efeitos da insulina na célula, mas não é o hormônio em si. Ela funciona para aqueles que não respondem à insulina diretamente e age por outras vias, como se fosse um atalho.
fórmula intranasal
Os testes foram feitos, no Rio de Janeiro, com camundongos e em neurônios isolados cultivados em laboratório. E no Canadá, com macacos. A droga conseguiu bloquear o efeito tóxico dos oligômeros e reverter os danos à memória. O próximo passo é investigar formas de adaptar a droga para agir apenas no cérebro sem afetar o resto do organismo. A ideia é administrar a fórmula via intranasal.
— O diabetes provoca alterações vasculares que induzem à demência — afirma o endocrinologista Marcus Leitão, do Instituto Estadual de Diabetes e Endocrinologia (Iede). — Qualquer iniciativa que controle os sintomas pode retardar o surgimento do Alzheimer.
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